Algum clube vai bancar técnico estrangeiro que não der resultado rápido?
A modernidade simbolizada pela importação de treinadores não aguenta 5 minutos de porrada em live de influencer depois de uma série sem vitórias
Convicção de dirigente do futebol brasileiro é igual aos princípios de Groucho Marx: “Estes são os meus princípios. Se não gosta deles, tenho outros.”
A convicção da vez é que ou você tem um técnico estrangeiro no banco de reservas ou você é um maníaco capaz de surrar a própria mãe na véspera de Natal.
Somente na semana passada, mais três clubes da Série A fizeram a escolha muito fácil - pelo menos aos olhos dos catedráticos do futebol - e importaram treinadores. O Corinthians com o português Vítor Pereira, o Santos com o argentino Fabián Bustos e o Botafogo com o português Luís Castro. Este último, altamente sujeito a subir no telhado ou, no mínimo, ficar travado até maio.
Os três se somam a Abel Ferreira (português, Palmeiras); Alexander Medina (uruguaio, Internacional); Antonio Mohammed (argentino, Atlético-MG); Gustavo Morínigo (paraguaio, Coritiba); Juan Vojvoda (argentino, Fortaleza) e Paulo Sousa (português, Flamengo). Serão 9 técnicos estrangeiros em 20 clubes da Série A.
Não será surpresa se a conta aumentar. Mesmo que pare por aqui, nove técnicos estrangeiros já é o suficiente para uma constatação óbvia: nem todos conseguirão no curto ou médio prazo os resultados esperados no momento da contratação.
O que leva a uma pergunta igualmente óbvia: aqueles que não conseguirem entregar resultado terão um tempo compatível com a convicção de quem foi buscar “novas ideias” nos técnicos estrangeiros ou serão tratados como qualquer treinador brasileiro que não faz o time ganhar? Ou seja, rua.
Não tenho muita dúvida de que a segunda alternativa irá predominar. Cinco minutos tomando porrada em live de influencer e o dirigente corre para o conforto da demissão do treinador. Não é teoria, é prática.
Jesualdo Ferreira caiu no Santos após 15 jogos; ser eliminado nas quartas de final do Campeonato Paulista foi a prova definitiva de que ele não era um Jorge Jesus. Domenéc Torrent também não era e o Flamengo precisou de 26 jogos para ter coragem de reconhecer isso.
Ricardo Sá Pinto passou 2 meses no Vasco, tempo suficiente para acomodar o clube confortavelmente na zona de rebaixamento. Ricardo Dudamel durou no Galo menos do que todos: 10 jogos.
Como diz o meme, errado não tá. Pois os clubes brasileiros apenas agiram segundo a sua cultura. Se prometeram aos estrangeiros que seria diferente, mentiram. Se os estrangeiros acreditaram por conta própria que teriam tempo para desenvolver o trabalho e depois entregar resultado, se iludiram ou, no mínimo, não avaliaram direito onde estavam pisando.
Sendo justo, dos 9 clubes que (no momento) vão começar o Brasileirão com técnico estrangeiro, 2 estão agindo diferente na prática.
O Coritiba contratou Morínigo ainda antes de cair para a Série B por ver nele a melhor opção para voltar à Série A. Bancou o técnico mesmo com a confirmação do rebaixamento e fiasco no estadual. A convicção foi recompensada pelo acesso. Agora, o sarrafo sobe um pouco; no mínimo, ficar na elite sem muito sofrimento.
O outro é o Fortaleza, levado por Juan Vojvoda muito mais à primeira página da classificação do Brasileirão do que planejava. Tanto que, quando o Leão era terceiro e engatou uma série de resultados ruins, com direito a derrota de goleada para o rival Ceará, houve quem pedisse a demissão do argentino. A diretoria não deixou o fracasso subir à cabeça e bancou o treinador. Agora, o sarrafo também sobe um pouco.
O Botafogo provavelmente deve dar o mesmo crédito extra a Luís Castro. O clube parece genuinamente disposto a fazer um trabalho de longo prazo e, sejamos sinceros, um dono acostumado ao Crystal Palace não terá grandes ambições de curto prazo nunca.
Para os demais, a verdade estará no resultado do fim de semana. Galo, Flamengo, Palmeiras e Corinthians querem nada menos do que títulos importantes. O Inter sempre se vê com elenco para ser campeão. O Santos sempre acredita que tem uma fornada de meninos da Vila prontos para brilhar. Ou os estrangeiros mostram rapidamente que estão no caminho de atender as expectativas ou é bom já pensarem como pretendem gastar a multa rescisória.
Eles podem até ter sido seduzidos por princípios como planejamento, trabalho de longo prazo e trazer novas ideias para elevar o nível do futebol brasileiro. Mas se esses princípios não servirem para trazer resultados, nenhum cartola irá hesitar em arrumar velhos princípios - e um novo treinador.