Que tal tirar narrador e comentarista das transmissões de futebol?
O Brasileirão começou com uma novidade inesperada, uma linha do tempo no lugar do cronômetro. Mas o que eu gostaria mesmo era de uma transmissão só com imagem e som de estádio.
Em 2022 tudo volta ao normal.
2022: arrancam o cronômetro do alto da tela na transmissão do Campeonato Brasileiro.
Aconteceu na sexta-feira, 8 de abril. Era pouco depois das 19 horas, quando a bola começou a rolar para Vasco x Vila Nova, jogo de abertura da Série B.
O cronômetro com o tempo de jogo, alocado há décadas abaixo do placar, foi tirado dali. Em seu lugar, uma linha do tempo azul, à esquerda da tela, com o tempo em fonte microscópica se movendo verticalmente do pé ao topo. Essa coisa aí do print.
Isso, claro, nos televisores em que é possível ver a totalidade da linha. Os gênios que criaram essa bossa não pensaram que alguns formatos de tela simplesmente seriam incompatíveis com tamanho brilhantismo. Acontece quando gênios estão bebaços da própria genialidade. Criam maravilhas que não cabem nas limitações do mundo dos mortais. O mundo realmente anda chato.
Tenho zero detalhes de como a linha do tempo foi concebida. Porém, com a bagagem de quem já se deparou com muita invencionice em outros carnavais da comunicação (e salvou a humanidade de algumas), me permito arriscar hipóteses.
A tarefa pode ter sido entregue a alguém que entende bastante de design, mas vive pouco a experiência de assistir futebol na TV. O resultado é algo tecnicamente perfeito, mas descolado do usuário do produto (ou, em bom português, “que caga para quem vê futebol na TV”).
Outra hipótese é o autor até acompanhar futebol na TV, mas achar que algo que funciona no seu mundinho será amado por todos. É a mentalidade que uma hora concebe o “Trikas”, outra nos brinda com essa linha do tempo. Para estes, já dediquei palavras de carinho.
Claro, posso estar errado. O ponto de partida pode ter sido pesquisas qualitativas e a linha do tempo, no fim, atender a uma demanda do público. Se for o caso, adoraria assistir a um Globo Repórter sobre torcedores de futebol que gostam da linha do tempo no lugar do cronômetro.
Na sexta-feira, cheguei a tuitar que essa linha do tempo cairia antes do primeiro técnico do Brasileirão. Subestimei nossos cartolas, que já degolaram dois logo na primeira rodada. Posso também estar subestimando a capacidade do ser humano de enfiar goela abaixo de todo mundo uma ideia ruim “porque decidimos assim e, quem quiser, pode acompanhar os jogos pelo rádio”.
Enquanto aguardamos as cenas dos próximos capítulos, aproveito para dar uma sugestão. O mesmo vento de ousadia que mandou para longe o reloginho poderia, também, varrer narradores e comentaristas das transmissões.
Calma, colegas! Abaixem as tochas e leiam.
Deve, sim, continuar havendo uma transmissão tradicional, com narrador e comentarista. Mas eu gostaria de ver uma aposta real das plataformas de streaming e do Premiere em disponibilizar uma opção de transmissão “limpa”, só com imagem e som ambiente.
Não é algo inédito. Hoje, Star Plus em alguns esportes americanos e HBO MAX em jogos menores da Liga dos Campeões trazem essa opção. Falo nessa alternativa em todos os jogos.
Comecei a escrever este texto assistindo a São Paulo x Athletico. Transmissão de Odinei Ribeiro, Noriega e Richarlyson. Ótimo. Gostaria de poder mudar o canal e ver o mesmo jogo sem narração. De ouvir o som da batida da bola, o grito da torcida, o técnico xingando o lateral.
Não há nada mais valioso para colocar dentro de campo quem está TV do que o som do estádio, algo que, na transmissão tradicional, acaba virando um BG do show conduzido por narrador, comentaristas e repórteres. É a tão falada “experiência”.
Outro dia, na final do Paulista, o Palmeiras promoveu algo neste espírito. Disponibilizou 1,5 mil ingressos para sócios acompanharem o jogo por um telão colocado atrás do palco do show do Maroon 5. Eles estariam no estádio, sentiriam todo o clima da partida, mas não veriam o campo. Até veriam, mas por meio de um telão. Admito que não vi relatos de quem acompanhou o jogo dessa maneira. Mas, como teste, me pareceu muito interessante.
De volta à transmissão, outras customizações seriam possíveis. Acrescentar estatísticas. Ou uma linha do tempo com marcos relevantes da partida (mais útil que a atual). Ou as escalações. Ou comentários em redes sociais. Ou mapa de calor em tempo real. Ou cotações do jogo em sites de aposta. Ou tudo isso, a ponto de a tela parecer um painel da Bloomberg, não mais uma transmissão de futebol.
Naturalmente, quanto mais customizável, mais tecnologia, desenvolvimento e custos envolvidos. Se não houver demanda na outra ponta, a conta não fecha, a ideia vai pra lata de lixo. O mesmo vale para a transmissão sem equipe de transmissão, embora o “entregável” dessa seja algo que o canal já recebe: o sinal do estádio limpo, com som ambiente. Portanto, custo menor.
A transmissão sem equipe de transmissão é uma ideia que, para este telespectador aqui, hoje, por questões geográficas, consumidor de futebol muito mais pela telinha do que no campo, ajudaria demais a matar a saudade da arquibancada e não se espraiar pelo sofá. Para você, claro, pode parecer uma cretinice. Entendo, mas alerto: ideias cretinas são postas em prática quando menos se espera.
Imagine, por exemplo, se alguém decidisse tirar o cronômetro do alto da tela e colocar no lugar uma linha do tempo que se move tela acima. Deixa pra lá… Ninguém teria um ideia tão estúpida como essa. Falta quanto tempo para acabar o jogo mesmo?